segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Saudades do seu Sérgio

Uma das lembranças mais fortes que eu tenho do meu pai é a do dia em que ele me deu duas pequenas peças em madeira para pintar. Eram umas peças indígenas que eu, com tinta fornecida por ele, pude colorir enquanto ele trabalhava e, entre uma pincelada e outra, a gente conversava. Eu era uma criança, claro, já que ele morreu quando eu tinha apenas 13 anos.
Também lembro do dia em que ele me levou para o show dO Balão Mágico em Belém quando eu tinha 9 anos. A mamãe quis a morte porque a gente havia acabado de se mudar para o prédio onde eu vivo até hoje e, em vez de ajudá-la, ele me pegou pelo braço e levou para o Mangueirão para ver a turminha. Cheguei a confundir com o show da Xuxa, mas, dias depois que escrevi esse post, minha mãe me fez lembrar que era mesmo a galera do Balão. Lembro - com certeza - que ele comprou uma daquelas bolas grandes, tipo as que vendem nos arredores da Basílica na época do Círio, e que deu um jeitinho da gente ir para o gramado, quando os nossos ingressos eram para a arquibancada. Coisas de meu pai...
Ele era aquele tipo de pessoa que vivia para ser feliz, mesmo com pouco dinheiro no bolso. Minha mãe sempre conta que se ele tivesse só dez reais e alguém viesse pedir emprestado, ele entregava, alegando que vai ver a pessoa não tinha mais com quem contar, enquanto ele tinha minha mãe. E juntos eles iam vivendo.
Seu Sérgio era do tipo que não abria mão de um bom queijo cuia à mesa. E era poeta também, um autodidata. Teve que sair cedo da escola, mas nunca deixou de ler, de perceber o mundo ao redor.
Foi com livros dele que conheci Machado de Assis, Gonçalves Dias, Camilo Castelo Branco, Eça de Queiroz e tantos outros. Ele, ao lado da minha mãezinha - que ainda vai viver muito, se Deus quiser - incentivava meu lado artístico: seja pela pintura, o desenho, a literatura ou a música. E não é que eu estava desenhando no dia em que o telefone tocou com a notícia que nenhum de nós quer ouvir? Era a notícia do fim da vida de quem a gente ama. Mas, não quero falar sobre isso. Quero falar do homem que ele foi, e agradecer pela mulher que - mesmo indo embora tão cedo desse plano - ele ajudou a construir. A mulher que hoje eu sou.
Então, nesse Dia de Finados, reproduzo aqui, como muito orgulho, o poema que ele dedicou para mim no dia do meu aniversário de 8 anos (26/12/84):

"COMO ÉS LINDA

Tu és bela, como é bela
linda aurora a despertar
És formosa como a noite,
quando amena e de luar,
Tú és linda, como é lindo
um puro céu cor de anil
Tú és casta, como é casta
uma carícia infantil

Tú és doce, como é doce
uma nota harmoniosa
Tú és meiga, como é meiga,
cândida pomba, mimosa

Tú és pura, como é pura
a branca rosa singela
Do céu tens a candura,
mimosa, linda donzela

Reúnes mil atrativos
Tens todas as perfeições
Um só volver de teus olhos
atrai ardentes paixões

Ninguém pode resistir
A tua graça e beleza
Tú és o ente mais lindo
que criou a natureza"

Saudades eternas, pai! Te amo!

2 comentários:

Dulcivânia Freitas disse...

Emocionante, vc escreve tão bem.

Ana disse...

Obrigada, Dulci! Bjs pra vc!!